PUBLICADO NO SITE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
EMENTA: HABEAS CORPUS. ARTIGOS 89 E 90 DA LEI Nº 8.666/93, ARTIGO 1º DO
DECRETO-LEI Nº 201/67 E ARTIGOS 288, ‘CAPUT’, 61, II, ‘A’, 62, I E II, E 69 DO
CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. INVIABILIDADE. DECISÃO
FUNDAMENTADA. ANÁLISE PRÉVIA DA POSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE MEDIDAS
CAUTELARES ALTERNATIVAS. DESNECESSIDADE. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS.
IRRELEVÂNCIA.
- O decreto de prisão preventiva
se mostra satisfatoriamente fundamentado quando o Julgador aponta elementos
concretos do caso em apuração que indicam a necessidade da medida extrema ante
o risco patente que a soltura do paciente pode trazer à ordem pública e à
instrução criminal.
- Constatado, de plano, que a
liberdade do acusado pode oferecer perigo concreto à ordem publica e à
instrução criminal, não se faz necessária a análise sobre a possibilidade de
imposição de medidas cautelares alternativas antes da decretação da prisão
preventiva.
- A existência de condições
pessoais favoráveis do paciente, por si só, não garante eventual direito
subjetivo à revogação da prisão preventiva decretada.
Habeas Corpus
Nº 1.0000.12.086978-9/000 - COMARCA DE Salinas - Paciente(s): MANOEL TEIXEIRA CRUZ - Autorid
Coatora: JD 2 V CV CR INF JUV COMARCA SALINAS
A C Ó R D Ã O
Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA
CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da
ata dos julgamentos, à unanimidade, em DENEGAR A ORDEM.
DES. RENATO MARTINS JACOB
Relator.
Des. Renato Martins Jacob (RELATOR)
V O T O
Cuida-se de HABEAS CORPUS impetrado pelos
ilustres advogados Rodrigo Suzana Guimarães e Adriano Cardoso da Silva em favor
de MANOEL TEIXEIRA CRUZ,
denunciado pela suposta prática dos crimes previstos nos artigos 89 e 90 da Lei nº 8.666/93, artigo 1º do
Decreto-Lei nº 201/67 e artigos 288, ‘caput, 61, II, ‘a, 62, I e II, e 69 do
Código Penal, apontando como autoridade coatora o MM. JUIZ DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL, CRIMINAL E DA INFÂNCIA E
JUVENTUDE DA COMARCA DE SALINAS.
Informam os doutos Impetrantes que o paciente foi preso
temporariamente em 21/06/2012, sendo sua custódia convertida em preventiva em
28/06/2012.
Sustentam que a decisão que convolou a prisão temporária em
preventiva não apresenta fundamentação idônea, frisando que a autoridade
judicial não analisou, antes de decretar a segregação do paciente, a
possibilidade de aplicação de medidas cautelares alternativas.
Frisa as condições pessoais abonadoras do paciente e pede,
liminarmente, a concessão da ordem para que seja restabelecida a sua liberdade
ou imposta alguma das medidas previstas no artigo 319 do Código de Processo
Penal.
Liminar indeferida às fls. 50/52 em sede de plantão.
Pedido de reconsideração da medida de urgência às fls. 59/63, por
mim indeferido às fls. 74/75.
Informações judiciais prestadas às fls. 77/78.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se às fls.
80/82, opinando pela denegação da ordem.
Na tarde do dia 28/08/2012,
recebi, em gabinete, o ilustre advogado Adriano Cardoso da Silva, oportunidade
em que repisou os argumentos constantes da impetração e apresentou memoriais
acompanhados de cópia da denúncia dando o paciente como incurso nas práticas
das condutas tipificadas nos artigos 89
e 90 da Lei nº 8.666/93, artigo 1º do Decreto-Lei nº 201/67 e artigos 288,
‘caput, 61, II, ‘a, 62, I e II, e 69 do Código Penal.
Após examinar os memoriais e
documentos ofertados, determinei a juntada “por linha” ao mandamus.
Sucintamente relatado. Passo a votar.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do habeas corpus.
Infere-se da extensa peça
acusatória (fls. 121/165) que foi formada, em tese, sofisticada organização
criminosa especializada em fraudes a licitações, atuante em vários Municípios
do norte de Minas Gerais.
O suposto grupo seria
composto pelo paciente, que é vereador, através da colaboração das
servidoras EDINETI XAVIER DOS SANTOS e EDAISE LUCIANA RODRIGUES CHAVES, além de
EVANDRO LEITE GARCIA, MARIA DAS GRAÇAS GONÇALVES GARCIA, ELISANGELA PEREIRA DA FONSECA e LUIZ
EDUARDO FONSECA MOTA, que atuavam como ‘empresários’ e sócios das empresas
vencedoras das licitações fraudadas e simulação de prestação de serviços e
execução de obras públicas. Ainda colaboravam, supostamente, com as ações
criminosas SINARA LEITE RODRIGUES e SANDRA LEITE GARCIA.
O paciente teve sua prisão
temporária decretada em 05/06/2012, cujo mandado foi cumprido em 21/06/2012.
A custódia temporária foi convertida em preventiva em 28/06/2012.
Feito este breve intróito, não vejo como dar guarida aos pedidos
constantes na impetração, permissa venia.
Entendo que a decisão que converteu a prisão temporária do
paciente em preventiva (fls. 34/38) não padece de qualquer vício de
fundamentação, eis o douto Magistrado de primeiro grau demonstrou, com base em elementos concretos do caso em
apuração, a necessidade e conveniência da medida extrema, na dicção do que
dispõem os artigos 93, IX, da Constituição Federal e 315 do Código de Processo
Penal.
Destacou que, com as provas até então colhidas, há certeza da
materialidade e indícios suficientes de autoria, tendo sido desmantelada uma suposta quadrilha especializada em fraudes
a licitações, “com o fito de desviarem
e/ou apropriarem-se de verbas públicas” (fl. 35).
Asseverou que “cuida-se de associação criminosa altamente
organizada, com atuação em diversos Municípios norte-mineiros, sendo que,
pelas investigações até agora realizadas, já se mostra possível desnudar em
parte o modo como cada um dos representados agia dentro da organização
criminosa” (fl. 35).
Discorreu sobre a suposta função de cada integrante do bando,
destacando, em relação ao paciente, que “atua no sentido de despistar, anular,
dificultar, pelos mais variados expedientes, a fiscalização dos Poderes
Executivo e Legislativo, de modo a evitar que as fraudes sejam descobertas, bem
como coordena as atividades criminosas de Edaise Luciana Rodrigues Chaves” (fl.
36 – grifei).
Ressaltou, adiante, que “foram apreendidos pela Polícia Federal, em
37 (trinta e sete) Municípios norte-mineiros, quase 200 (duzentos) processos
licitatórios, todos ‘vencidos’ pelas empresas do bando para a execução de obras
públicas, sendo que o dano ao erário é estimado em R$ 100.000.000,00 (cem
milhões de reais)” (fl. 37).
Aduziu, acertadamente, que a custódia provisória do paciente
mostra-se imperiosa para a garantia
da ordem pública, tendo em vista a gravidade concreta dos delitos a ele
imputados, não se olvidando que,
segundo a denúncia, o paciente valia-se de seu cargo público de vereador para
coordenar as atividades ilegais e dificultar a fiscalização dos órgãos
competentes.
Ainda, a possibilidade
concreta de reiteração delitiva, considerando que os investigados veem,
supostamente, há longo período nesta desenfreada onda de crimes (segundo a denúncia, há pelo menos quinze
anos), justifica a medida extrema para salvaguardar o corpo social.
Na sequência, o douto Julgador destacou a necessidade da prisão
da paciente para “assegurar a efetividade da persecução criminal, de modo a evitar
interferências destes nas demais investigações a serem efetivadas” (fl.
37).
Afirmou que “a liberdade dos representados pode
acarretar o aliciamento ou a intimidação de testemunhas, a supressão e
destruição de provas, a modificação do estado de fato de algumas obras, a
ocultação de bens entre tantas outras artimanhas no sentido de impedir o
desfecho das investigações” (fl. 37).
Salientou que “foi apreendida imensa quantidade de
documentos, inclusive computadores e mídias, cuja análise ainda está em curso”,
bem como que “perscrutam-se, ainda, quem foram os executores das obras públicas em
cada Município e como funcionava a quadrilha, além de estar sendo realizado o
levantamento patrimonial em nome de testas-de-ferro” (fl. 37).
Apontou que todas essas diligências podem ser inviabilizadas com
a libertação dos investigados, que oferecem risco concreto à instrução criminal.
Diante de todas essas circunstâncias, entendo que agiu com acerto
o douto Juiz de primeiro grau, restando evidenciada a imperiosidade da prisão
preventiva do paciente pela garantia
da ordem pública e conveniência
da instrução criminal.
Forçoso reconhecer, assim, que a decisão hostilizada revelou-se
correta frente ao disposto no artigo 312 do Código de Processo Penal,
atendendo, ainda, às exigências do reformado artigo 313 do mesmo codex.
Assim, demonstrada a necessidade da medida e a correta
fundamentação na manutenção da prisão cautelar, as alegadas condições pessoais
favoráveis do paciente não são suficientes para a concessão do benefício
pleiteado, conforme o entendimento majoritário:
"A denegação da liberdade provisória, apesar da
primariedade e dos bons antecedentes do acusado, não acarreta constrangimento
ilegal quando a preservação da prisão em flagrante se recomenda, pela presença
dos motivos que autorizam a custódia preventiva" (STJ - RT 583/471).
“(...) As condições subjetivas favoráveis do paciente,
tais como primariedade, bons antecedentes, residência fixa e trabalho lícito,
por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando preenchidos seus
pressupostos legais. Habeas Corpus denegado, em conformidade com o parecer do
MPF.” (HC 75862/PB, Rel. Min. Napoleão
Nunes Maia Filho, j. 29.08.2007).
Observo, finalmente, que não se faz necessária a análise da
possibilidade de imposição de medidas cautelares alternativas antes da
decretação da prisão preventiva quando constatado, de plano, que o acusado, em liberdade, oferece risco à ordem
pública ou econômica.
Isso porque a lei indica a aplicação de medidas cautelares
observando-se necessidade para aplicação da Lei Penal, para a investigação ou a
instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática
de infrações penais.
Ainda que o conceito de “evitar a prática de infrações penais”
esteja abarcado no de “garantia da ordem pública”, quer me parecer que quando o
acusado, solto, colocar em risco a tranquilidade social, apenas é cabível a
prisão preventiva.
Nesse sentido é a lição do mestre GUILHERME DE SOUZA NUCCI:
“O art. 282, I, abraçando esse requisitos, empresta dois
fatores diretamente ligados à prisão preventiva (art. 312, CPP), embora com
módicas alterações, que são: garantia de aplicação da lei penal e conveniência
da investigação ou instrução criminal. Além desses, cria um novo fator,
consistente na evitabilidade da prática de infrações penais, nos casos expressamente
previstos em lei.
Note-se que não se refere o mencionado inciso aos outros
dois fatores de decretação da prisão preventiva, que são a garantia da ordem
pública e a garantia da ordem econômica. Quer-se crer, por uma questão de
lógica, que somente a prisão preventiva pode ser cabível nessas hipóteses.
Aliás, há sentido nessa interpretação, pois se o indiciado
ou réu coloca em risco a segurança pública, não há cabimento para a
substituição da prisão por medida cautelar alternativa, que são muito menos abrangentes
e eficazes. (Prisão e liberdade: as
reformas processuais penais introduzidas pela Lei 12.403, de 4 de maio de 2011.
São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011. p. 27)
Esse é exatamente o caso dos autos. Constatado o perigo concreto
que o paciente, em liberdade, pode trazer à ordem pública e à instrução
criminal, não se mostra adequada ou eficaz a imposição de medidas cautelares
alternativas.
Destarte, inviável, sob qualquer ângulo que se analise, o pleito
liberatório do paciente.
Ante o exposto, atento ao parecer da douta Procuradoria-Geral de
Justiça, denego a ordem de Habeas Corpus.
Sem custas.
Des. Nelson Missias De Morais - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Matheus Chaves Jardim - De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: "DENEGADO O
HABEAS CORPUS ."